Santos é uma cidade muito conhecida, tanto por ser um local turístico, com opções de cultura, natureza e lazer, quanto por possuir o maior jardim de orla do mundo. Além do jardim, há também cinema, biblioteca, escola de arte, entre outros atrativos. Porém há algo inusitado no lugar: prédios “tombados". Estes prédios sofreram recalque diferencial, ou seja, o solo cedeu de modo desigual fazendo com que as construções ficassem anormalmente inclinadas.
O solo da orla de Santos é composto majoritariamente de camadas de areia fina e argilas moles, sendo estes a causa geral dos problemas de recalque nos prédios, uma vez que só se encontra rocha maciça em profundidades maiores de 40 metros. As areias possuem baixa resistência a cisalhamento o que as tornam um substrato sem muita estabilidade, enquanto as argilas moles, por serem advindas de águas salgadas ou com alto teor de salinidade, apresentam estrutura floculada aberta, o que as torna bastante compressíveis. Com isso, há mais de um fator que influencia no dado problema requerendo uma atenção especial na hora de planejar a estrutura a ser executada (YANEZ, 2023).
Uma vez que essa problemática ocorre a anos, existem diversos estudos versando sobre o tema, sendo eles de instituições acadêmicas ou de empresas privadas que visavam construir no local. Deste modo, tem-se uma base de dados sobre o perfil do solo na região em diversos pontos, existem perfis com mais informação geológica da região, como pode ser observado nas Figuras 1 e 2, mas também é possível encontrar perfis de característica mais pontual como visto na Figura 3.
Figura 1 - Perfil geológico ao longo da orla marítima de Santos - SP
Fonte: Adaptada de Teixeira (1994) por Massad (2003)
Figura 2 - Perfil geotécnico da orla santista e do estuário – lado Terra
Fonte: Adaptado de Teixeira (1994) por Massad (2003) complementado por Dias M. (2008)
Figura 3- Perfil por sondagem SPT do solo de Santos
Fonte: (DIAS, 2008)
Na Figura 4 é possível analisar algumas representações realizadas na região. Primeiramente é possível observar uma camada composta por areia medianamente compacta com espessuras entre 6 e 20 m, com predominância entre 10 e 15 m, SPT variando de 9 a 30. Em seguida são encontradas camadas de argila muito mole, com profundidades entre 10 e 30 m e valores de SPT entre 0 e 4. Em profundidade encontramos novamente areia de compacidade variável. Após os 20m a 25m, são encontradas as argilas de consistência média a rija e valores de SPT superiores a 5 golpes. Abaixo destas temos camadas de areia compacta e/ou sedimentos continentais e solo residual.
Figura 4: Perfil Geotécnico sintético da orla praiana de Santos
Fonte: Adaptada de Teixeira (1994) por Massad (2003)
Pelas imagens aqui apresentadas é possível compreender o quão complexo pode ser o solo, suas camadas superiores podem encobrir diversos tipos de solo e, dessa forma, pode apresentar comportamentos diferentes do esperado, como foi o que ocorreu na orla de Santos. É de suma importância a realização de ensaios para se compreender com o que ocasião se está lidando e assim realizar uma obra que atenderá seu objetivo final sem grandes surpresas negativas como pudemos observar nesse caso.
Referências:
DIAS, Marianna Silva. ANÁLISE DO COMPORTAMENTO DE EDIFÍCIOS APOIADOS EM FUNDAÇÃO DIRETA NO BAIRRO DA PONTA DA PRAIA NA CIDADE DE SANTOS. Disponível em: https://www.teses.usp.br/teses/disponiveis/3/3145/tde-20082010-160223/publico/Dissertacao_Marianna_Silva_Dias.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
MASSAD, Faiçal. Características Geológicas e Geotécnicas dos Solos da Baixada Santista com ênfase na Cidade de Santos. In: Workshop Passado Presente e Futuro dos Edifícios da Orla Marítima de Santos. Santos, 2003
MENDOÇA, Jocélio C.; REIS, Joselay H. C.; AOKI, Nelson. Notas de aula prática de Mecânica dos Solos II (parte 7). Disponível em: https://engcivil20142.files.wordpress.com/2017/02/notas-de-aula-prc3a1tica-7-mec-solos-ii.pdf. Acesso em: 20 set. 2023.
REDAÇÃO. O que fazer para curtir o dia na orla de Santos. 2023. Disponível em: https://meulugar.quintoandar.com.br/orla-de-santos/. Acesso em: 20 set. 2023
YANEZ, Diego Gazolli. Parâmetros Geotécnicos das Argilas Marinhas da Região do Porto de Santos. 2023. Disponível em: https://www.researchgate.net/publication/315925359_Parametros_Geotecnicos_das_Argilas_Marinhas_da_Regiao_do_Porto_de_Santos. Acesso em: 20 set. 2023.
A cidade de Capitólio em Minas Gerais é um ponto turístico muito conhecido por suas paisagens naturais, como mostra a Figura 1. Infelizmente, em janeiro de 2022 houve um tombamento de bloco no cânion no Lago de Furnas, localizado na cidade, o desastre teve como consequência a morte de 10 pessoas, além de 27 feridos. O local do desprendimento de bloco contava com lanchas que transportavam dezenas de turistas, atingindo o total de três embarcações (Amado, 2023).
Figura 1: Lago de Furnas - Capitólio - MG
Fonte: Obbá Coema
Após o incidente, especialistas de todo Brasil iniciaram as 7investigações das possíveis causas dessa movimentação de massa e relacionaram com a geologia do local, além de tentar entender se era possível evitar a tragédia ocorrida.
De acordo com o geólogo Flávio Henrique Freitas e Silva, o bloco de pedra do cânion tinha 1,2 bilhão de anos e 10 mil toneladas, e, apesar dos desmoronamentos de rochas serem comuns, a tragédia poderia ter sido evitada com o monitoramento geológico local e a introdução de normas de segurança para o turismo (Leite, 2022).
O tombamento de blocos, mostrado na Figura 2, é um fenômeno geológico listado como “movimento gravitacional de massa” e é condicionado pela presença de fraturas nas rochas, que separam os blocos fragilizados do maciço original. Geralmente, a rocha precisa apresentar fraturas verticais e horizontais em estado mais avançado de alargamento para que um tombamento de tal magnitude ocorra (Paladino, 2022).
Figura 2: Tombamento
Fonte:Igeológico
Os cânions de Capitólio são essencialmente formados por camadas horizontais de quartzitos, rochas oriundas do arenito. Pelo movimento de placas tectônicas, a rocha sedimentar arenito foi submersa e sofreu uma série de alterações químicas ao longo do tempo e, passou por um evento de metamorfose conhecido como “deformação brasiliana”, que o transformou em quartzito, a rocha naturalmente fraturada que forma o cânion atualmente (Leite, 2022).
Durante sua existência de cerca de 600 milhões de anos, esses quartzitos foram desgastados tanto por pressões internas da Terra quanto por agentes do intemperismo e da erosão (como as chuvas e os ventos), o que lhes rendeu o aspecto fraturado atual. A presença da vegetação, algo muito comum nessas áreas, também colabora para a desagregação das rochas, já que as raízes vegetais procuram umidade e espaços, proporcionados pelas fraturas (Paladino, 2022).
Através do monitoramento geotécnico é possível analisar o nível de instabilidade dessas formações, sendo possível constatar se há risco iminente, alto, médio ou baixo de ocorrer algum tombamento. Caso seja observado risco iminente ou alto existem técnicas para contenção ou desmonte do bloco. Como Capitólio possui rochas grandes recomenda-se desmonte controlado (derrubar o bloco instável) através de técnicas manuais, como alpinismo com vergalhões de ferro, ou com a utilização de explosivos de baixa magnitude (Paladino, 2022).
Idealmente, as análises de riscos deveriam ser feitas anualmente, se dividindo em duas etapas: antes da época de chuvas, para verificar as áreas que estão em risco e fazer o desmonte ou controle, e depois do encerramento do período chuvoso, durante o qual podem ter ocorrido várias trombas d’água e ondas de cheias na área. Dessa forma, a área será caracterizada como segura ou se há novas áreas de risco.
Em nosso país, as diretrizes para o mapeamento e a prevenção em áreas de risco são estabelecidas pela Política Nacional de Proteção e Defesa Civil, instituída pela Lei nº 12.608 de 10 de abril de 2012. A prática do monitoramento geotécnico de áreas turísticas é insuficiente em todo o Brasil, sendo mais focadas em áreas urbanas, onde há um risco maior por conter uma densidade populacional mais elevada. Por esse motivo, espaços rurais e turísticos não são tão visados e possuem recursos insuficientes para que os municípios elaborem ações destinadas ao monitoramento dessas áreas.
Referências:
AMADO, Aécio. Tragédia no cânion de Capitólio, em Minas Gerais, completa um ano hoje. 2023. Disponível em: https://agenciabrasil.ebc.com.br/geral/noticia/2023-01/tragedia-no-canion-de-capitolio-em-minas-gerais-completa-um-ano-hoje. Acesso em: 05 ago. 2023.
LEITE, Hellen. Capitólio: rocha tinha 1,2 bilhão de anos e 10 mil toneladas, diz geólogo. 2022. R7 Brasília. Disponível em: https://noticias.r7.com/brasilia/capitolio-rocha-tinha-12-bilhao-de-anos-e-10-mil-toneladas-diz-geologo-09012022. Acesso em: 05 jul. 2023.
PALADINO, Guilherme. Geólogos explicam desabamento de cânion em Capitólio e veem Brasil atrasado em avaliações de segurança de áreas turísticas. 2022. Jornal da Unesp. Disponível em: https://jornal.unesp.br/2022/01/14/geologos-explicam-desabamento-de-canion-em-capitolio-e-veem-brasil-atrasado-no-monitoramento-de-seguranca-de-areas-turisticas/. Acesso em: 05 jul. 2023.
PRESIDÊNCIA DA REPÚBLICA CASA CIVIL. Política Nacional de Proteção e Defesa Civil nº 12608, Dispõe sobre o Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil - SINPDEC e o Conselho Nacional de Proteção e Defesa Civil - CONPDEC; Brasília, 10 abr. 2012. Disponível em:
https://www.planalto.gov.br/ccivil_03/_ato2011-2014/2012/lei/l12608.htm
Atualizado: 17 de out. de 2023
A fundação de uma obra é um dos elementos primordiais no que se refere à estrutura e sustentação de um projeto. Sendo ela o primeiro elemento a ser construído, é um dos mais problemáticos caso haja algum erro, principalmente porque são as estruturas responsáveis por receber todas as cargas que possam ocorrer na construção, transferindo-as para o solo subjacente.
Considerando então a importância dessa etapa, é de se imaginar que projetar uma fundação não seja uma tarefa simples. Para tal, é necessário fazer uma série de estudos, levantando muitas variáveis para enfim decidir quais tipos poderão ser empregados e dentre eles qual é a melhor opção para o caso em particular (Pointer, 2018)
Os tipos de fundações podem ser classificados de duas formas principais, as fundações rasas e as profundas. Em cada uma delas existem diversas técnicas e meios de se implementar, porém essa divisão já funciona como um importante norte no que tange a decisão final do tipo de estrutura a ser implementada. A Figura 1 demonstra algumas fundações que podem ser utilizadas na construção civil.
Figura 1: Exemplos dos tipos de fundações
As fundações rasas, mostradas na Figura 2, se tratam daquelas que não precisam de muita escavação para ser feita, o que pode ocorrer por alguns fatores, mas o principal é se ter um solo com uma boa resistência e uma obra de menor porte, ou seja, com menor peso. Destas podemos citar alguns exemplos como sapata isolada, sapata associada, radier, bloco de fundação, dentre outros.
Figura 2: Exemplos de fundações rasas
Fonte: Escola Engenharia
Já as fundações profundas, mostradas na Figura 3, requerem uma profundidade mínima de escavação de 3 metros, e diferentemente da anterior, pode transferir a carga para o solo de mais de uma forma, não só pela base, mas também pelas superfícies laterais ou pela combinação de ambas. Tal fator ajuda a fornecer uma maior sustentação, levando então a essa ser a escolha ideal para condições de solos pouco resistentes. Neste caso, trata-se de uma escavação mais trabalhosa que acarreta no seu custo bem mais elevado. Algumas das fundações profundas que podem ser citadas são as estacas, que podem variar de materiais e formatos, e os tubulões que também possuem diferentes utilizações entre eles (Celere, 2022).
Figura 3: Exemplos de fundações profundas
Fonte: Mais Controle
De posse do conhecimento das diversas opções para fundações existentes, é preciso definir qual a mais adequada para o caso. Tendo isso em mente, devem ser realizados testes e cálculos para definir alguns parâmetros de suma importância. Como já citado anteriormente, é necessário saber a dimensão das cargas que a fundação terá de suportar e é preciso saber se o solo é capaz de suportar tais esforços através do conhecimento dos seus materiais e da resistência do mesmo. Além disso, existem outros fatores que devem ser levados em conta, como o nível do lençol freático por exemplo (União Fundações, 2018)
A fundação é uma etapa primordial para a garantia da integridade física da estrutura, principalmente com o passar do tempo, sendo assim ela deve ser planejada e executada da melhor forma possível para que futuros problemas possam ser evitados, tais como fissuras na estrutura pronta, necessidade de reforço após a construção, recalques não admissíveis da estrutura (afundamento além do planejado) ou até em casos mais graves o risco de ruptura (Dan Solução, 2020).
Portanto, é de suma importância que antes mesmo de começar uma construção, sejam realizados estudos sobre a capacidade do substrato reagir às tensões que serão impostas sobre ele, para que desse modo se tenha embasamento técnico sobre qual deve ser o melhor método de fundação para o caso em específico. Claro que se o dilema de custo não fosse presente as fundações mais profundas seriam no geral a opção que garantiria maior estabilidade, porém grande parte do trabalho do engenheiro em uma construção é dimensionar tudo de um jeito que o trabalho não seja demasiadamente oneroso para o cliente, ao passo que deve assegurar que o projeto é seguro conforme normas e leis que regem seu trabalho.
Referências:
Como escolher o tipo de fundação da obra. União fundações. Disponível em: <https://www.uniaofundacoes.com.br/como-escolher-o-tipo-de-fundacao-da-obra/>. Acesso em: 20 de setembro de 2023.
Entenda quais as consequências que as patologias em fundações podem causar. Dan, 06 de maio de 2020. Disponível em: <https://dansolucao.com.br/entenda-quais-as-consequencias-que-as-patologias-em-fundacoes-podem-causar/>. Acesso em: 20 de setembro de 2023.
Fundação de obra: entenda o que é e para quê serve. Pointer, 08 de fevereiro de 2018. Disponível em: <https://pointer.com.br/blog/fundacao-de-obra/>. Acesso em: 20 de setembro de 2023.
Fundações de obras: como escolher a mais adequada para cada projeto. Celere, 13 de janeiro de 2022. Disponível em: <https://celere-ce.com.br/construcao-civil/fundacoes-de-obras/>. Acesso em: 20 de setembro de 2023.